A realidade das cidades brasileiras
A maior parte da população brasileira mora nos grandes centros urbanos. Segundo o IBGE, no censo de 2010, mais de 81% dos brasileiros moram nas cidades. Mostram também, que 70% dos municípios brasileiros
possuíam até 20 mil habitantes, 25% possuíam entre 20 mil e 100 mil habitantes, e apenas 5%, ou 283, possuíam mais de 100 mil habitantes. No entanto, nesse último grupo vivem 54,7% (104 milhões), no grupo intermediário, vivem 28,1% (53,6 milhões) e no primeiro grupo, dos municípios menores, vivem 17,1% (32 milhões) da população brasileira. Trata-se de uma urbanização concentrada, sobretudo, em áreas metropolitanas. E nelas se concentram vários problemas relacionados à qualidade de vida.
Os problemas das cidades e as soluções estão associados com os dilemas do campo. As questões de reforma urbana e agrária estão vinculados aos assuntos sobre a propriedade. A concentração da terra e a expansão urbana, são problemas relacionados com a propriedade.
O Estatuto da Cidade, lei federal nº 10.257/2001, é uma grande conquista nesse tema. A luta pela reforma urbana é um processo constante de ação e reflexão, procurando construir direitos sociais que combatem a exclusão econômica e social.
Uma série de instrumentos legais foram criados, para a melhora da qualidade de vida das cidades e uso mais social do solo urbano. Que possibilitem o controle das iniciativas públicas e privadas foram aprovadas pelo legislativo em suas diferentes esferas.
As cidades em questão
A percepção do acesso à cidade como um direito de praticá-la, vivenciá-la ultrapassa a sua condição de unidade social complexa, nos moldes da gestão urbana convencional.
Destacam-se dentre os instrumentos legais implantados:
- Tributários – IPTU: Imposto Predial e Territorial Urbano, progressivo no tempo para as áreas ociosas.
- Jurídicos: Edificação compulsória, desapropriação, discriminação das terras públicas e regularização de loteamentos ilegais e áreas faveladas.
- Urbanísticos: Criação de zonas especiais de investimentos públicos e maiores exigências para aprovação dos loteamentos.
- Participação Popular: Mecanismos como emendas populares que podem ser apresentadas no âmbito do Legislativo e dos Conselhos Municipais instituídos em várias prefeituras do país, onde a sociedade civil participa, por seus representantes, na definição dos Planos Diretores.
O Estatuto da Cidade define um conjunto de instrumentos para que o município tenha condições de construir uma política urbana que concretize a função social da propriedade urbana.
De acordo com o Estatuto, o plano diretor deve englobar todo o território municipal (e não apenas a área urbana) e articular-se com o planejamento orçamentário, viabilizem a participação direta da sociedade, garantindo a ampla publicidade, o acesso irrestrito a documentos, estudos e informações produzidos, bem como a realização de audiências públicas para debate das proposições.
Consolidou também, um novo paradigma jurídico sobre a questão da propriedade imobiliária, não apenas em função dos direitos individuais, mas sobretudo em função das responsabilidades e obrigações do proprietário de um bem imóvel. Bem como dos direitos coletivos e sociais sobre o solo urbano e seus recursos.
O plano diretor é obrigatório para municípios com mais de 20 mil habitantes que integrem regiões metropolitanas ou aglomerações urbanas, inseridos em áreas de interesse turístico ou em regiões submetidas à influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional e para os municípios incluídos no cadastro nacional de municípios vulneráveis a desastres naturais.
O Estatuto estabelece ainda o conteúdo mínimo dos planos diretores. Ele deve identificar as áreas onde serão aplicados os instrumentos municipais. O plano diretor que deve estabelecer qual o uso adequado de cada parte do território, estabelecendo limites ao direito irrestrito do proprietário da terra, com o objetivo de garantir o interesse público.
A implementação do Estatuto da Cidade no Brasil possui uma correlação estreita com a política habitacional. Principalmente considerando-se a importância dos programas de habitação desenhados e em execução de larga escala a partir de 2007. Esses programas constituem um vetor importante de expansão dos centros urbanos e de tratamento dos passivos urbanos representados pelos assentamentos precários das metrópoles brasileiras.
A cidade como um bem comum contém os seguintes componentes:
- A cidade livre de discriminação: com base no sexo, idade, estado de saúde, renda, nacionalidade, etnia, condição migratória, ou orientação política, religiosa ou sexual.
- A cidade com cidadania inclusiva: na qual todos os habitantes, permanentes ou transitórios, são considerados como cidadãos e com direitos iguais. Sendo eles, mulheres, pessoas que vivem na pobreza, aqueles que em situações de risco ambiental, trabalhadores da economia informal, grupos étnicos, religiosos, LGBTs, portadores de deficiência, crianças, jovens, idosos, migrantes, refugiados, moradores de rua, vítimas da violência e os povos indígenas.
- A cidade com maior participação política: na definição, implementação, monitoramento e orçamentação das políticas urbanas e de ordenamento do território, a fim de reforçar a transparência, a eficácia e a inclusão da diversidade de habitantes e suas organizações.
- A cidade com as suas funções sociais: ou seja, que garante o acesso equitativo de todos a habitação, bens, serviços e oportunidades urbanas, especialmente para as mulheres e outros grupos marginalizados.
- Uma cidade que prioriza o interesse público: coletivamente definido, garantindo um uso socialmente justo e ambientalmente equilibrado dos espaços urbanos e rurais.
- Uma cidade com espaços públicos de qualidade: que melhora a interação social e participação política, promove as expressões socioculturais, abraça a diversidade e promove a coesão social.
- Uma cidade onde os espaços públicos contribuem para a construção de cidades mais seguras: ou seja, para satisfazer as necessidades dos habitantes.
- A cidade com igualdade de gênero: que adota todas as medidas necessárias para combater a discriminação em todas as suas formas contra as mulheres, homens e LGBTs em termos políticos, sociais, econômicos e culturais.
- Uma cidade que tome todas as medidas apropriadas para assegurar o pleno desenvolvimento das mulheres: para garantir a igualdade no exercício e o cumprimento dos direitos humanos fundamentais e uma vida livre de violência.
- A cidade com diversidade cultural: que respeita, protege e promove os diversos meios de vida, costumes, memória, identidades, expressões e formas socioculturais dos seus habitantes.
- A cidade com economias inclusivas: que garante o acesso aos meios de subsistência e trabalho decente para todos os habitantes, que dá espaço a outras economias, como a economia solidária, consumo colaborativo, economia circular, e que reconhece o papel das mulheres na economia do cuidado.
- A cidade como um sistema de assentamento e ecossistema comum: que respeita os vínculos rural-urbano, protege a biodiversidade, habitats naturais e ecossistemas circundantes, e suporta cidades-regiões, a cooperação cidade-cidade e a conectividade.
É inegável que nos últimos anos, existem avanços na formulação de políticas públicas para o desenvolvimento sustentável. Mas ainda não traduzem em resultados de transformação das situações de desigualdade social e territorial.
A disputa política sobre os modelos e visões de cidade, vai depender de possíveis alianças entre os movimentos urbanos tradicionais com os novos movimentos emergentes, que podem renovar e inovar as formas da prática da cidadania, da solidariedade e da organização e mobilização social.
Venha construir tranquilo.